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segunda-feira, 8 de abril de 2019

Uma Filosofia Esclarecedora.

EUDAIMONIA ARISTOTÉLICA 


Vamos conceituar o que é Eudaimonia:

Eudaimonia (do grego antigo: εὐδαιμονία) é um termo grego que literalmente significa 'o estado de ser habitado por um bom daemon, um bom gênio', e, em geral, é traduzido como felicidade ou bem-estar. Contudo, outras traduções têm sido propostas para melhor expressar.

 Entendendo o conceito desta palavra vamos ler a Eudaimonia Aristotélica.

 A finalidade natural de todos os seres humanos, segundo Aristóteles, consiste em ter uma vida boa, justa e feliz(Eudaimonia). Partindo deste princípio, este filósofo propõe investigar qual é o fim ético que todo indivíduo aspira e quais caminhos ele deve trilhar em direção desta busca.

 Diferentemente da honra, da inteligência e da riqueza, a felicidade é auto- suficiente (autárkeia), pois não necessita de bens exteriores para ser atingida, ao passo que os outros meios são buscados em favor de distintos bens.
 Na visão de Aristóteles, segundo Chauí, aquilo que, à parte de todo o resto, torna a vida desejável e não carece de nenhum outro é um bem mais perfeito do que qualquer outro. E a felicidade é um bem desse gênero, pois ela não é buscada em vista de outra coisa e sim as outras coisas é que são buscadas como meios para ela (CHAUÍ, 2002 p. 441).

 O bem é idealizado como uma virtude, uma atividade cotidiana que procura a excelência de acordo com o exercício da razão, sendo tão sublime que nos aproxima do divino. Sendo a felicidade um fim em si mesmo é conceituada na filosofia aristotélica como um bem supremo, algo absoluto que converge na ação.
A ética é um saber prático que tem por objeto a ação humana, ao agir o homem atualiza sua forma e busca a excelência em todos os aspectos do seu ser (físico, biológico, social, psicológico etc.).
Aristóteles diferenciou as ciências práticas (ética, política) das teoréticas (as artes ou técnicas), sendo que as primeiras possuem um fim em si mesmas, e as últimas não possuem esta mesma autonomia, pois seu fim é uma obra diferente. No entanto, tais atividades possuem um aspecto comum, ambas tem como finalidade um bem. Na ética aristotélica o bem é a forma harmoniosa de convivência entre os cidadãos da pólis.

 A ética tem como pressuposto mostrar o caminho para se chegar à felicidade, “Como toda ciência prática, a ética deve determinar a essência do fim a ser alcançado, a essência do agente e das ações e os meios para realizá-la” (CHAUÍ 2002, p. 441). Sendo assim, esta ética pretende investigar não somente o que é o bem, mas como nos tornarmos bons.
O bem ético é a vivência das virtudes no cotidiano, se difere da felicidade uma vez que alcançá-la é o resultando da conquista de uma vida inteira. O bem se diz de várias formas de acordo com a substância (atividade pura; intelecto); a qualidade (excelência ou virtude); e a quantidade (justo meio), e também de acordo com a ação e a paixão (desejo racional).
A ação ética se refere ao contingente, ou seja, uma atitude que não pode ser prevista, pois depende da escolha do indivíduo, esta determinará se ele é ético ou não. Aristóteles considerava o homem como um ser misto, dotado de tendências tanto racionais quanto irracionais, sendo estas últimas consideradas como apetites e inclinações. O homem vive em constante conflito entre os anseios racionais e os desejos, isto é, a vontade de substituir a dor pelo prazer, definida como paixão (páthos), tal como escreve Chauí.
 Por sua naturalidade, ela é o núcleo de nossa vida ética ou feliz; e por sua violência, ela está na origem de todos os vícios humanos. A presença da paixão como um elemento essencial da ação moral faz com que a tarefa da ética seja educar nosso desejo para que não se torne vício e colabore com a ação feita por meio da virtude. Em outras palavras, Aristóteles não expulsa a afetividade, mas busca os meios pelos quais o desejo passional se torne desejo virtuoso (CHAUÍ, 2002 p. 444).
Nesse sentido, o desejo surge no momento em que o indivíduo é afetado por causas externas, este desejo é o agente dos sentimentos e das emoções presentes no ser humano, é um movimento representado por uma dualidade: por um lado, o objeto que afeta o homem e por outro o caráter ou índole que determinará como se tornar virtuoso.
A virtude é o agir humano mediado pela razão, a ética tem a incumbência de orientar na aquisição deste hábito a fim de tornar o homem prudente (phrónimos). Chauí relaciona desejo e virtude da seguinte maneira:
O desejo é paixão, páthos, passividade, submissão aos objetos exteriores que nos afetam e aos impulsos e inclinações interiores, determinados por nosso temperamento. A virtude é ação, atividade da vontade que delibera e escolhe segundo a orientação da razão, a qual determina os fins racionais de uma escolha, com vista ao bem do agente, isto é, sua felicidade. O virtuoso é feliz porque prudente e prudente porque moderador e moderado (CHAUÍ, 2002 p.447).
Na perspectiva de Aristóteles, os desejos são neutros, se tornam maus a partir do momento em que não se ajustam à medida racional, por isso diz que as pessoas não nascem boas, mas se tornam boas quando praticam a ação ética para atingir a felicidade.
O homem para ser considerado ético na perspectiva aristotélica precisa ter a capacidade de deliberar sobre as coisas boas e úteis para si, atento à totalidade do bem viver. O homem prudente é capaz de discernir e ditar regras, normas e preceitos de conduta. Não sendo considerada ciência nem arte, a prudência é uma disposição prática que garante a autonomia e a auto-suficiênciapara que o homem possa direcionar sua própria vida, enfim, libertando-se da escravidão causada pelos excessos de passividade ou paixão.
Ao propor estudar a ética, Aristóteles deixa claro que o bem e a finalidade do homem é a felicidade, desse modo, diferia da cultura de seu tempo que compreendia o conceito de felicidade vinculado aos prazeres e ao gozo sensual:
A julgar pela vida que os homens levam, estes, em sua maioria e os mais vulgares entre eles, parecem (não sem um certo fundamento) identificar o bem ou a felicidade com o prazer, e por isso amam a vida agradável. (...) A grande maioria dos homens se assemelha a escravos, preferindo uma vida comparável à dos animais (ARISTÓTELES, Livro I, 5, 1096 b [15], 2010).
Entretando, o filósofo pondera que pessoas de maior discernimento identificam a felicidade com a honra, proveniente da vida política. E ainda aqueles que concebiam a felicidade com o acúmulo de riquezas. “Quanto à vida dedicada a ganhar dinheiro, é uma vida forçada (...) trata-se de uma coisa útil, nada mais, e desejada no interesse de outra coisa” (ARISTÓTELES, Livro I, 5, 1096 a [5], 2010). Tanto os prazeres, a honra, a riqueza, a razão e as demais virtudes são escolhidas no interesse da felicidade, contudo, essa que é considerada um bem supremo e auto-suficiente.
Aristóteles apresenta outras condições para que o homem seja feliz, não descartando totalmente a possibilidade de utilizar os bens exteriores como forma de alcançá-la,
(...) a felicidade necessita igualmente dos bens exteriores, pois é impossível, ou pelo menos não é fácil, praticar ações nobres sem os devidos meios. Em muitas ações usamos como instrumentos os amigos, a riqueza e o poder político; e há coisas cuja ausência empana a felicidade – como a estirpe, a boa descendência, a beleza (ARISTÓTELES, Livro I, 8, 1099 a [30], 2010).
É importante ressaltar que ao falar sobre os instrumentos que empanam a felicidade, o filósofo impunha uma grande importância à aparência, ao companheirismo e à família, destacando que sem estes não haveria probabilidades de o homem ser feliz. Lembrando que no contexto em que Aristóteles viveu a cultura grega era permeada pela valorização do belo e da perfeição.
O estudo da ética aristotélica nos apresenta várias condições para considerar uma vida feliz, tais como a prática das virtudes, o cultivo das amizades,preservação da saúde, suficiência de bens materiais, convivência harmoniosa na pólis e acesso as discussões filosóficas.
A prática das virtudes é um dos temas centrais da ética aristotélica, pois molda o caráter humano e orienta os costumes das pessoas, elevando seus sentimentos e educando os instintos. A virtude pertence à atividade virtuosa, ou seja, agir bem de acordo com o que é justo e correto.
Ao tratar do cultivo das amizades, Aristóteles as define como sendo “uma certa virtude, ou não podendo existir sem virtude. Além disso, é o que há de mais necessário para viver” (ARISTÓTELES, Livro VIII, 1, 1155 a, 2010). Ele considera a amizade como uma forma indispensável à vida do ser humano quando afirma “Sem amigos, a vida não vale a pena ser vivida” (ARISTÓTELES, Livro VIII, 1, 1155 a,
2010). Desse modo, mostra que a relação de amizade requer reciprocidade, um “querer bem” que só possível por meio de práticas virtuosas.
No que se refere à saúde e a suficiência de bens materiais, o filósofo mostra a importância da moderação, dado que para ser feliz o homem não necessita de muitas ou de grandes coisas, uma vez que os excessos corrompem a mente. Assim escreve:
Mesmo com recursos moderados, pode-se proceder virtuosamente (aliás, isso é evidente, pois se pensa que um cidadão pode praticar atos não menos dignos que os dos que detêm o poder; e muitas vezes até mais), basta que tenhamos o necessário para isso, pois a vida das pessoas que agem em conformidade com a virtude será feliz (ARISTÓTELES, Livro VIII, 8, 2010).
Assim, o filósofo explica que mesmo não tendo riqueza e poder, no que diz respeito à virtude, é preciso possuí-la ou tentar todos os meios que possam ajudar o homem a tornar-se bom.
Outra condição apontada por Aristóteles para que o homem seja feliz é conviver em uma sociedade justa, visando o bem coletivo e comunicando a percepção de valores. O pensador grego concebia o homem como “um animal político” que necessita viver em comunidade, buscando a completude em seus semelhantes.
Finalmente, as discussões filosóficas completam as condições da vida feliz, é o mais alto grau da felicidade, o conhecimento das verdades imutáveis (a vida contemplativa) em que Aristóteles considerava acessível apenas a algunsfilósofos. Isso não implica que somente estes têm a possibilidade de ser feliz, pois sendo a felicidade um bem humano, está ao alcance de todos que contemplem as demais condições.
A felicidade como fim ético é uma atividade da alma em consonância com as virtudes, tendo em vista um bem que pode ser tanto coletivo quando individual. O homem para ser feliz deve agir retamente e saber deliberar sobre todas as coisas, só assim alcançará a mais nobre e aprazível coisa do mundo: a eudaimonía aristotélica.

Conclusão

Ao se pensar sobre a ética atualmente não há como descartar as contribuições que Aristóteles legou à humanidade. Ele construiu um sistema de preceitos e condutas que orientam as pessoas a agirem retamente buscando um ideal de felicidade baseado na convivência harmoniosa na cidade, de forma que a natureza do homem seja moldada e encontre completude no âmbito da política e da ética.
A fragmentação do mundo contemporâneo faz com que os elevados conceitos da ética em Aristóteles chegassem até nós baseados no contrato social e não mais no princípio de natureza humana. Porém esta mudança não suprimiu a busca de criar uma sociedade justa, solidária e pacífica.
Muitas das concepções apresentadas por Aristóteles, no percorrer do tempo, foram interpretadas e ressignificadas afastando-nos das suas proposições originais, assim os temas ética e felicidade ganharam novas formulações conceituais.
A ética contemporânea baseia-se em normas de condutas e preceitos morais e não mais como um conjunto de boas ações direcionadas ao bem, quer seja individual ou coletivo.
A felicidade é buscada hoje pela maioria das pessoas no sentido de obter ganhos materiais, se perdendo em um consumismo exacerbado e alienante, de maneira que o comportamento seja ditado pelo o que os diversos tipos de mídia veiculam, tendo o individualismo e a competitividade como mobilizadores deste processo desumanizante. Já a eudaimonía aristotélica postula as condições para o ser humano alcançar a felicidade, baseada nos princípios da racionalidade,considerando o justo-meio o principal caminho para conduzir o homem a tal bem supremo.
A leitura e o estudo da obra aristotélica nos revelam que, através do exercício das virtudes, é possível ser feliz, tendo uma vida equilibrada e consciente de que não basta somente viver, mas viver bem culminando numa existência livre e satisfatória.

Referências
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. [Trad. Torrieri Guimarães]. 4. ed. São Paulo: Martin Claret, 2010. 237 p.
CHAUI, M. Introdução à História da Filosofia: dos pré-socráticos a Aristóteles. Vol.
1. 2 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 328-486.
FARIA, M. B. Aristóteles: a plenitude como horizonte do ser. 1. ed. São Paulo: Moderna, 1994. 136 p.
HUISMAN, D. Dicionário dos Filósofos. [Trad. Cláudio Berliner et alli]. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 61-71.


Via: www.ufvjm.edu.br/vozes


 Por Jhony Ribeiro 

Cordialmente,

                                

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